Apesar de rever ligeiramente em alta as suas previsões para a crescimento da economia, o Banco de Portugal projecta que as contas públicas poderão, ao contrário do que garante o Governo, regressar aos défices nos próximos anos, com o país a violar as novas regras orçamentais europeias caso não sejam postas em prática novas medidas de consolidação.
O alerta da entidade liderada por Mário Centeno é feito no boletim económico de Dezembro publicado esta sexta-feira. Para além de novas previsões para a economia, o banco central faz também novas projecções para a evolução das contas públicas, com números que diferem substancialmente dos apresentados pelo Governo no Orçamento do Estado para 2025.
Para este ano, o Banco de Portugal até aponta para um resultado mais favorável, estimando que se irá registar um excedente de 0,6% do PIB, em vez dos 0,4% antecipados pelo Ministério das Finanças de Joaquim Miranda Sarmento. No entanto, para os anos seguintes, as contas de Centeno já apontam para resultados mais desfavoráveis do que as do Governo.
Em 2025, o OE tem como meta um excedente de 0,3% do PIB, mas o banco central estima que o resultado deverá ser um regresso a um défice, de 0,1%. O cenário traçado pelo Banco de Portugal torna-se ainda mais negativo nos anos seguintes, com os défices a agravarem-se para 1% e 0,9%, impedindo uma redução tão acentuada da dívida pública como a prevista pelo Executivo.
Centeno atribui a responsabilidade destes resultados às medidas com impacto permanente que foram tomadas. “A manutenção da situação orçamental deficitária é explicada pelos efeitos das medidas permanentes já adoptadas, que impactam tanto a despesa pública como a receita fiscal, pelos empréstimos do PRR previstos para 2026 e, a partir de 2027, pelo aumento de despesa nacional necessária para assegurar a continuidade dos projectos financiados pelo PRR”, afirma o banco no boletim económico.
Para além dos défices, o Banco de Portugal alerta igualmente para o risco de o país não conseguir cumprir a trajectória orçamental com que se comprometeu em Outubro com Bruxelas. Seguindo as novas regras orçamentais, o Governo estabeleceu limites para a variação da despesa líquida (a despesa que exclui despesas extraordinárias, com juros e da qual se deduzem as medidas discricionárias do lado da receita) nos próximos quatro anos, mas o Banco de Portugal estima que, com as actuais medidas em vigor, estes podem vir a ser ultrapassados.
Logo para 2025, o Governo comprometeu-se com uma variação da despesa líquida de 5%, mas o Banco de Portugal estima que poderá ser de 6%. A diferença, em valores absolutos, é superior a 1000 milhões de euros, já que o Governo estabelece um limite para a variação da despesa líquida em 2025 de 5594 milhões de euros, mas o Banco de Portugal estima que esta possa chegar aos 6669 milhões de euros.
E nos dois anos seguintes, o mesmo acontece com as variações da despesa líquida projectadas pelo banco central (6,8% em 2026 e 3,4% em 2027) a superarem as do plano entregue pelo Governo a Bruxelas (5,1% e 1,2%).
“Na ausência de novas medidas de contenção da despesa ou de aumento da receita, o cumprimento das novas regras orçamentais europeias poderá estar comprometido”, alerta o banco no boletim económico publicado esta sexta-feira.
Para a economia, o Governo tornou-se ligeiramente mais optimista. Em Outubro passado, tinha apontado para taxas de crescimento do PIB de 1,6% este ano e de 2,1% no próximo, mas agora antecipa taxas de crescimento que estão 0,1 pontos percentuais acima, nos 1,7% em 2024 e 2,2% em 2025.
O banco central diz ainda que “o maior dinamismo da actividade nos próximos dois anos reflecte um enquadramento mais favorável, com a melhoria das condições financeiras, a aceleração esperada da procura externa e a maior entrada de fundos da União Europeia”, assinalando ainda que “a orientação expansionista e pró-cíclica da política orçamental contribui igualmente para o maior dinamismo da actividade”.